“Eu não tenho condições de ir a uma igreja. Eu sou muito diferente de vocês e não há como convivermos. Preciso consertar muitas coisas antes de ir a um culto.” Essa foi a resposta de uma jovem mulher, quando a convidei para participar de uma reunião de mulheres na minha igreja.
Essa fala bateu em meu coração como uma flecha, penetrando e rasgando a minha ideia de que eu estava cumprindo o meu papel de cristã com um discurso bonito e um convite agradável. Ela precisava mais do que palavras, ela precisava se sentir acolhida.
O que estamos fazendo de errado para que, ao invés daquela moça olhar para nós como referência de amor, passasse a nos ver como um modelo inalcançável e excludente?
Na época de Jesus, a lepra era uma doença terrível! O estrago que ela causava era tão rápido quanto a velocidade com que se alastrava. Em um dia a pessoa tinha uma vida normal, no outro ninguém mais poderia tocá-la. A única forma de conter a epidemia, era a contenção dos doentes e a proteção dos que estavam saudáveis.
Em Lucas no capítulo 5, temos o registro de um leproso indo ao encontro de Jesus. Aquele homem foi tomado por uma grande fé, grande ao ponto dele deixar o seu “campo de concentração, a sua colônia de leprosos – perceba que ele estava agindo de forma perigosa e ilegal (cf. Lv 13 e 14) -, e ir de encontro com Jesus.
Eu fico imaginando os pensamentos daquele homem enquanto ele ia àquele encontro. Pensamentos como: “sou impuro; estou colocando em risco os outros; todos são limpos, menos eu”.
Medo e desespero com certeza foram sentimentos que ele experimentou, mas não foram o suficiente para pará-lo. A sua fé era tamanha, que ele chama Jesus de “Senhor”. A palavra grega usada para “Senhor” nesse texto foi kurios, que significa supremacia, usada para identificar Deus ou o Messias. Aquele leproso creu que Jesus era Deus.
Naquele encontro, Jesus fez algo escandaloso diante daquela cultura, daquela época, daquelas pessoas: Jesus tocou aquele leproso – que não poderia ser tocado, que tinha seu corpo repleto de chagas, que era impuro, sujo. E aquele toque mudou a vida dele para sempre. “No mesmo instante lhe desapareceu a lepra” (Lc 5.13b).
Jesus veio ao mundo e foi a representação viva da graça de Deus. Ele encheu aqueles que estavam vazios, curou os que estavam doentes, amou aqueles que o odiaram. A graça vinda do toque de Jesus foi e é mais contagiante que qualquer doença, pecado, preconceito, diferença. E isso não mudou. Deus está vivo e continua a restaurar o perdido.
Quando aquela jovem moça me falou que não era digna de entrar em uma igreja, ficou claro que ela se sentia como o leproso, mas que ainda não tinha a fé que o moveu. Ela se sentia suja, impura, diferente e até perigosa para as pessoas da comunidade. Ela não via na igreja um lugar de acolhimento, de amor, de inclusão e de cura, ao contrário disso, ela via como um lugar de acusação.
Em João 13.34, 35 Jesus nos dá um novo mandamento, de que deveríamos amar uns aos outros como ele nos amou e que assim seríamos reconhecidos como seus discípulos. João também escreve que “não amemos de palavra nem de boca, mas em ação e em verdade.” (1Jo 3.18)
Temos demonstrado amor ao próximo, como Cristo nos amou? Será que temos mesmo sido sal da terra e luz do mundo ou temos deixado tudo insípido e escuro, virando os holofotes para nosso próprio umbigo?
A graça de Jesus é contagiante e não excludente. Precisamos nos lembrar de que já estivemos no lugar do perdido. Fomos alcançados pela graça, pelo amor, pela misericórdia de Deus, que nos resgatou de trevas eternas e tudo isso sem merecermos. A salvação não é mérito nosso, é graça mediante a fé em Cristo Jesus. E precisamos ter essa verdade gravada em nossos corações, ou nosso belo discurso não será coerente com as nossas ações.
Não podemos convidar as pessoas para viver de uma forma diferente, se não agimos de forma diferente. Veja bem, há uma grande diferença entre aprovação e aceitação e isso precisa ficar claro para nós. Aceitar uma pessoa traz inclusão, traz proximidade, confiança, abre portas para um diálogo, cria pontes ao invés de abismos. Já a aprovação é algo diferente. Ninguém aprova tudo que os outros fazem, nem mesmo pais aprovam tudo o que seus filhos fazem, mas ainda assim não deixam de amá-los e de aceitá-los.
Marcos escreve no capítulo 9 verso 50: “Tende sal em vós mesmos e paz uns com os outros.”. E como fazemos isso? Demonstrando, através dos nossos atos, que fomos contagiados pela graça de Deus, que penetrou em nossos corações, removendo o coração de pedra e nos dando um coração de carne, capaz de edificar, fortalecer, confortar, amar, perdoar, suportar, abraçar. Uma nova identidade que nos permite trazer as margens para o centro, que revela que o que mais nos humilhou não nos fere mais. Uma identidade que agrega e que acolhe de forma que as pessoas, inclusive aquela jovem mulher, se sintam seguras para tirarem as bandagens de suas chagas e confiarem no amor que lava e cura, o amor de Deus.
Que possamos nos parecer de fato com Jesus, não só nas palavras, mas em nossos relacionamentos. Ter palavras fortes e construir relacionamentos fracos não é amar como Cristo nos amou, é uma violência ao nosso próximo. Que Deus nos abençoe nessa caminhada e que possamos abraçar ao invés de repelir.
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