Imagine a seguinte situação: no sábado um crente frequenta o ministério jovem de uma igreja por considerá-lo mais ativo. No domingo pela manhã, ele participa da EBD de outra igreja, pois acha seu ensino mais profundo. No culto da noite, ele vai a uma terceira igreja, pois crê que ela segue o princípio regulador do culto mais fielmente. Durante a semana assiste à séries de pregações no YouTube do pregador com quem ele mais se identifica teologicamente, lamentando não poder frequentar sua igreja, por ser em outro estado. Assim vive um “poligrejado”. Frequenta várias igrejas, mas não se compromete com nenhuma.

Implicações

A princípio, essa prática não parece ser um problema, afinal, melhor ser um “poligrejado” do que um “desigrejado”, correto? Creio que não. Vamos pensar sobre alguns princípios bíblicos que são quebrados ao frequentar mais de uma igreja:

1. Servir a igreja e não “consumi-la” – o problema dessa prática é a visão consumista da igreja. A pessoa frequenta a igreja por aquilo que ela pode lhe oferecer e não com a motivação de servir e manifestar o evangelho (Fp 2.1-11). Assim monta um “combo” com o melhor de cada igreja pensando apenas em si mesma. A motivação deve ser o amor que nos leva a servir, e não a consumir (Mc 10.45, 1 Co 12-13, Ef 4.1-16).

2. Amor ao próximo – se a pessoa não está comprometida com um local específico, não consegue cultivar relacionamentos profundos dentro da igreja, mas apenas superficiais. Amar alguém é mais do que ter conversas esporádicas, mas sim um envolvimento sacrificial na vida do outro, e isso exige constância (1 Jo 3.16).

3. Manifestar as imagens bíblicas para igreja – não estar comprometido com um grupo específico de crentes, mas pular de igreja em igreja, impede a pessoa de manifestar imagens bíblicas como o “Corpo de Cristo” (um braço serve apenas um corpo – 1 Co 12), “Família de Deus” (a família se relaciona em um local específico – Ef 3.14-15), “Pedras Vivas que formam um Templo” (as pedras precisam estar juntas para formar o edifício, a casa, o templo – 1 Pe 2.5).

4. Servir com o dom que Deus lhe deu – (1 Co 12-14) – segundo o texto de 1 Co 12.7, o dom é dado pelo Espírito visando ao bem comum, ou seja, o que for melhor para um grupo específico. Servir em várias igrejas implicará em, cedo ou tarde, deixar uma das igrejas na mão. É como tentar manter dois empregos no mesmo turno.

5. Comunhão na Ceia – (1 Co 10.17) – a Ceia do Senhor é uma refeição em que manifestamos comunhão com Deus, por meio do sacrifício de Cristo, e comunhão uns com os outros. Se não há comprometimento com um grupo, a participação na Ceia não revela a verdade da prática, pois a comunhão com os outros não é profunda e verdadeira.

6. Pastoreio – (1 Pe 5.2) – caso não haja comprometimento com uma igreja local, os pastores e líderes não saberão por quem eles são responsáveis, e por quem deverão prestar conta. Parafraseando o ditado: “ovelha de dois pastores morre por falta de pastoreio”.

7. Submissão aos líderes – (Hb 13.7,17) – quando nos comprometemos com uma igreja local, sabemos quem são nossos líderes e a quem devemos nos submeter. Participando de várias igrejas, na prática, não nos submetemos a ninguém. Em um momento ou outro o “poligrejado” vai acabar deixando um líder de uma igreja na mão para servir o líder da outra. Além de ser tentado a se submeter à liderança que for mais conveniente, esvaziando o conceito de submissão.

8. Submissão à disciplina eclesiástica – (Mt 16.19, 18.15-20, 1 Co 5) – estar comprometido e submisso a uma igreja local também nos submete à disciplina da igreja. Qual das igrejas disciplinará o “poligrejado”? Infelizmente alguns optam por frequentar várias igrejas justamente para não estar debaixo da disciplina de nenhuma. Apronta em uma igreja, e foge para outra.

9. Discipulado – (Mt 28.19-20) – fazer discípulos implica dedicação de tempo e envolvimento. Participar de várias igrejas limita a profundidade dos relacionamentos e por isso, limita o discipulado.

10. Manifestar o evangelho – (Jo 17.20-21, Ef 3.10) – relacionamentos profundos manifestam o evangelho. Relacionamentos improváveis que se tornam possíveis por causa do evangelho, exaltam o evangelho. Já falamos que se envolver com várias igrejas dificulta relacionamentos profundos, afetando assim a expressão do evangelho pela comunhão da igreja.

11. Manifestar a santidade de Deus – (Ap 20.15) – pertencer a uma lista de membros de uma igreja local ilustra ao mundo que existe uma separação entre quem é povo de Deus e quem não é. Obviamente não quero dizer que todos os que pertencem ao rol de membros de uma igreja são verdadeiramente povo de Deus, mas, apesar das suas limitações, a lista de membresia é uma ilustração do livro da vida. Quem participa de várias igrejas, não tendo o nome em nenhuma lista de membros, deixa de proclamar essa verdade.

Obviamente, reconhecemos que há espaço para interação com irmãos de outras igrejas locais, como intercâmbios e congressos. Isso é saudável e também manifesta a glória de Deus! Tudo isso, porém, com equilíbrio, não afetando os princípios bíblicos para a igreja.

Precisamos ser humildes e nos comprometermos com uma igreja local, com seus pontos fortes e fracos; e, cumprindo nosso papel como membros, contribuirmos para o seu crescimento, à medida em que nós mesmos crescemos, juntos com os irmãos, até alcançarmos a maturidade, a medida da plenitude de Cristo, para a glória de Deus (Ef 4.1-16)!

Autor: Ricardo Gonçalves Libaneo

Fonte: Voltemos ao Evangelho

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