Quando uma fadiga emocional severa me forçou a deixar o campo missionário, eu sabia que precisava de ajuda. Com medo e desesperada para obter uma resposta, fui até um conselheiro cristão.
Primeiro, minhas respostas às perguntas dele eram reservadas, mas à medida que notei sua compaixão e compreensão, comecei a me sentir segura.
Logo as palavras começaram a sair, conforme ele me ouvia intencionalmente. Semelhante a traços largos de um pincel, minhas palavras recriavam cenas completas: memórias de incidentes passados, áreas de confusão. As perguntas perspicazes que ele fazia me ajudavam a descrever meus sentimentos, dos quais muitos estavam profundamente enterrados. Conversar com alguém que se importava me deu a chance de ouvir meus próprios pensamentos, e esse foi o início da minha cura.
Meses depois, com minha saúde restaurada e com o coração alegre por ter uma nova segurança interna, eu disse ao meu conselheiro: “Uma das melhores coisas que você fez por mim foi me ouvir”. Então perguntei: “Ouvir é um dom?”.
“Não”, ele respondeu.
“Então como você aprendeu a ouvir tão bem?”
“Praticando”, disse ele, garantindo que qualquer um que deseje pode aprender a ouvir melhor.
Então respondi: “Se eu puder aprender, talvez Deus possa me usar para ajudar alguém, assim como você me ajudou”.
Já faz dois anos. Eu ainda estou comprometida a ouvir, porque creio que é um dos meios mais eficazes que Deus nos deu para ajudar uns aos outros. Tenho aprendido que ouvir é uma habilidade difícil de aprender, mas que vale muito a pena.
Por que ouvir?
A fim de aumentar minha própria capacidade de ouvir, comecei a observar e falar com bons ouvintes. Descobri que eles têm disposição para ouvir porque aprenderam que ouvir afeta o comportamento humano de forma poderosa, e, portanto, com muita paciência, eles se treinaram para ouvir.
Comecei a registrar em uma caderneta minhas descobertas sobre o papel que ouvir desempenha. Primeiro, aprendi que ouvir afirma as pessoas. De fato, é uma das formas mais elevadas de afirmação. Quando ouvimos, convidamos a outra pessoa a existir. Um chefe que para na mesa da secretária para ouvir a opinião dela, uma mãe que para de limpar a casa para ouvir seu filho, um cliente que pergunta “Como vai?” a um vendedor; cada uma dessas pessoas reconhece a existência do outro.
Jesus fez isso com frequência. Em Marcos 10, estava cercado por uma grande multidão ao sair de Jericó. Mesmo assim, quando ouviu um cego que a ele clamava, as Escrituras dizem que “Jesus parou”, chamou Bartimeu e o ouviu. Depois, aprendi que fortalecemos uns aos outros ao sermos bons ouvintes. Na leitura dos evangelhos, é possível sentir que até Jesus buscou o encorajamento decorrente de compartilhar sentimentos pessoais com alguém que o ouviria.
Em Prescriptions for a Tired Housewife [Prescrições para uma dona de casa cansada], James Dobson ressalta: “Por alguma estranha razão, os seres humanos […] toleram estresse e pressão com maior facilidade se pelo menos outra pessoa souber que estão passando tal situação”. Se aprendermos a fazer perguntas perspicazes, e se esperarmos pelas respostas, podemos ser essa “outra pessoa” de que alguém precisa para compartilhar os fardos da vida.
Terceiro, ouvir ajuda o falante a esclarecer seus pensamentos. Dawson Trotman já repetia: “Os pensamentos são esclarecidos quando passam pelos lábios ou pela ponta dos dedos” — ou seja, ao falar ou escrever. Quando damos a oportunidade de falar às pessoas, nós as ajudamos a desemaranhar pensamentos. Já diz Provérbios 20.5: “Os propósitos do coração humano são como águas profundas, mas quem é inteligente sabe como trazê-los à tona” (NAA).
Jesus trazia pessoas à tona. Por exemplo, ele não estava com pressa quando iniciou o diálogo com a mulher junto ao poço (João 4), sabendo que ela precisaria de tempo para ir além das camadas superficiais de questões teológicas.
Esse mesmo tipo de conversa, sem pressa, me ajuda quanto tento solucionar algo com que estou lutando. No meu emprego, meu supervisor criou uma atmosfera na qual sou livre para falar com ele a qualquer momento. Semana passada, quando me senti pressionada, conversamos. No processo, senti que pude identificar a fonte da pressão. Expressar meus sentimentos me encorajou a ser honesta comigo mesma, algo que nem sempre foi fácil. A disposição dele para ouvir me ajudou a fazer uma leitura precisa de onde estou, e pude me comprometer a fazer algumas correções.
Um bom ouvinte nos dá a oportunidade de expressar nossas visões sem sermos julgados, interrompidos ou redirecionados. Nós nos sentimos seguros e sem pressa, assim podemos expressar o que está dentro de nós.
O quarto ponto que descobri é que ser um bom ouvinte melhora a precisão da nossa resposta ao que os outros dizem. Em Provérbios 25.11-12, lemos: “Como maçãs de ouro em salvas de prata, assim é a palavra dita na hora certa. Como pendentes de ouro e gargantilhas de ouro puro, assim é a sábia repreensão para o ouvido obediente” (A21).
Salomão sabia que um bom conselho só funciona na “hora certa” e quando é proferido a um “ouvido obediente”.
Nos estágios iniciais do burnout, enquanto eu lutava contra a depressão em segredo, participei de um retiro com outros missionários. Uma amiga e eu arrumávamos nossas camas certa manhã, eu perguntei: “Como você lida com a depressão?”.
Enquanto terminava de arrumar o cobertor, ela sorriu e disse: “Eu? Apenas vou de uma depressão para a outra”. E esse foi o fim da nossa conversa.
Desde então, aprendi que muitas pessoas estão na mesma situação em que eu estava naquele dia: por trás da pergunta há uma afirmação, e por trás da afirmação, longe da vista, um sentimento. Quando perguntei a ela como ela lidava com a depressão, eu tentei dizer: “Eu estou deprimida”. E por trás disso estava um sentimento ainda mais difícil de expressar: “Estou com medo”. Eu precisava expressar aquilo, mas não consegui.
Como ser um bom ouvinte ajuda em uma situação como essa? Primeiro, ser um bom ouvinte encoraja o falante a continuar falando. O primeiro problema mencionado raramente é o verdadeiro. Só quando o falante continua a falar é que a conversa começa a ir até a raiz.
Ouvir por tempo suficiente nos ajudará a identificar o problema real e a descobrir o sentimento por trás dele. Infelizmente, muitas vezes estamos preocupados demais com nós mesmos enquanto ouvimos. Em vez de nos concentrarmos no que é dito, estamos ocupados decidindo o que dizer em seguida, ou rejeitando mentalmente o ponto de vista do outro.
Provérbios 18.13 diz que “responder antes de ouvir é tolice e vergonha” (A21). Eu me envergonho das vezes em que dei algum conselho apenas para descobrir que estava respondendo a uma pergunta que nunca foi feita. Tais erros custam caro porque deixam que o falante se sinta mal compreendido e apreensivo.
Da mesma forma, ser um bom ouvinte com frequência neutraliza as emoções que são parte do problema discutido. Às vezes, separar tais emoções é o necessário para resolver o problema. Pode ser que o falante não deseje nem espere que digamos algo em resposta.
Certa manhã, eu tomava chá com uma amiga muito próxima recém-chegada do campo missionário. Na segurança do amor dela, eu me abri e contei da grande luta que estava enfrentando. Eu falei, com os olhos cheios de lágrimas, que me sentia sozinha, como se Deus não estivesse comigo.
Ela ouviu, então tomou minha mão e a apertou. Os olhos dela mostravam muita compaixão. E ela disse: “Ele está com você”.
Foi tudo o que ela disse. Nenhum argumento teológico. Nenhuma condenação do tipo “você não deveria se sentir assim”. De algum modo, ela conhecia minhas dúvidas e sabia que eu só precisava me expressar.
É claro, às vezes expressar sentimentos reprimidos é apenas parte da solução. Mas, para mim, em geral a expressão é uma necessidade primária.
Como melhorar
Uma das melhores formas de aprender a ouvir é estudar a vida de Jesus. Leia os evangelhos e observe como este esplêndido mestre afirma as pessoas, traz elas à tona e identifica as reais necessidades delas com precisão. Jesus nos motiva a ouvir melhor.
Os provérbios também são uma excelente fonte de conselhos práticos. Com um lápis colorido, comecei a destacar todos os versículos que ensinam a ouvir.
A fim de fazer com que esse aprendizado fizesse parte de mim, adotei uma abordagem em cinco passos.
Primeiro, memorizei vários versículos sobre ouvir melhor, como Isaías 50.4:
O Senhor Deus me deu língua de eruditos, para que eu saiba dizer boa palavra ao cansado. Ele me desperta todas as manhãs, desperta-me o ouvido para que eu ouça como os eruditos.
A cada manhã eu separo um tempo para orar vários versículos que ensinam a ouvir. Eu peço ao Senhor que me dê ouvidos para ouvir e uma língua para sustentar outros.
Segundo, parei de achar que ouvir é uma atividade passiva. O ex-senador da California S.I. Hayakawa disse que “para ouvir, é preciso entrar na situação da outra pessoa ativamente, com muita imaginação, e tentar entender com base em uma visão diferente da sua”. Para isso, é necessário combater a distração. Pergunte-se: “O que essa pessoa está me dizendo? O que ele ou ela quer dizer?”. Não quero ser como o tolo de Provérbios 18.2, que “não tem prazer no entendimento, mas tão somente em revelar sua opinião” (A21).
Terceiro, eu conscientemente me retiro do foco, a fim de criar espaço para o outro se abrir e falar. Em The Wounded Healer [O terapeuta ferido], Henri Nouwen cita James Hillman, diretor acadêmico do Instituto C.G. Jung em Zurique: “Para que o outro se abra e fale, é preciso que o conselheiro saia do foco. Eu devo me esconder para dar espaço ao outro. Essa retirada, em vez de sair ao encontro do outro, é um intenso ato de concentração”.
Após ouvir, eu costumava fazer comentários como: “Sei como você se sente”. Então eu contava algo similar que aconteceu comigo. Às vezes a história ajudava, mas muitas vezes era só uma distração. Estou aprendendo a sair do foco enquanto escuto.
Quarto, eu enfatizo afirmações mais do que respostas. Antes, enquanto ouvia, eu tinha a compulsão de querer “resolver as coisas”, como se a outra pessoa me pedisse para fazer algo. Tenho aprendido que, embora haja situações em que devo oferecer uma resposta ou ajuda direta, muitas vezes Deus apenas quer me usar como canal do seu amor afirmativo, conforme ouço com compaixão e compreensão. Quando a outra pessoa encontra segurança, ela começa a crer que Deus a ama. Nessa atmosfera de afirmação, Deus é capaz de operar na vida dela, e os resultados são muito melhores do que qualquer conselho que eu poderia oferecer.
Por fim, encaro ser um bom ouvinte como uma habilidade a ser melhorada aos poucos. O progresso é lento, e há vezes em que fico desanimada.
A fim de melhorar, pedi aos meus colegas de trabalho que me ajudassem apontando quando eu falho em ouvi-los. Também reviso o dia enquanto dirijo de volta para casa. Eu penso nas interações no escritório, ao telefone e no almoço. Faço notas mentais de situações em que me perdi e falhei em ouvir. Eu repasso as conversas e imagino perguntas que eu queria ter feito, e respostas que eu queria ter dado. Essa prática mental me prepara para a próxima vez.
Ouvir bem é algo que demanda tempo e prática. Também demanda um coração que se importa. Certa vez, uma professora da quarta série perguntou a seus alunos: “O que é ouvir?”. Depois de alguns minutos de silêncio, uma garotinha levantou a mão: “Ouvir é querer escutar”.
Senhor, faz-nos pessoas que queiram escutar.
Autora: Janet Dunn
Fonte: Voltemos ao Evangelho
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